A neve continuava a cair em pequenos flocos, para lá da vidraça.
A janela enfeitada por uma cortina vermelho-sol, saída da rota da seda, clareava o minúsculo quarto onde tudo acontecia.
Doze metros quadrados de intimidade, no máximo, eram o mundo de Jasmyn. O nome europeizado pela sonoridade, era vietnamita pelo berço e holandês por ambição.
Ali era cozinha, sala, quarto, casa de banho.
Não era a primeira vez, mas seria a última, que eu ali ficava refastelado no quentinho da policama, enquanto Jasmyn ia trabalhar.
A cozinha dum restaurante asiático, provavelmente também vietnamita quanto ela, era a fonte do seu sustento.
Despediu-se de mim com um beijo na testa e uma carícia no rosto. Partiu. Quarenta anos de mulher, duas vezes de mim, deixavam para trás um desejo saciado e fenecido, na esperança de outro no regresso.
Lá fora o frio convidava o guerreiro do amor a repousar da diaforese havida, mais bélica que apaixonada. Depois era só puxar as orelhas aos lençóis e estender a tolha de mesa sobre o colchão impregnado de odores perenes.
Deitado, ora adormecendo, ora preguiçando, olhava aquele liliputiano mundo que conhecia já de sobejo e pensava em como ocupar o resto do dia, quamanho era o meu tempo.
Na escada do prédio, o cadenciado barulho de passos fez-me convergir o olhar para a porta do quarto. Um tornear de chave e maçaneta fizeram-me gelar. Especada à porta do quarto, uma jovem asiática, aparentando os meus vinte anos, franze o sobrolho de espanto. A visão dum desconhecido naquela cama, não menos espantado que ela, fá-la hesitar.
Fecha a porta sem tirar de mim o olhar. Quem és tu, quem sou eu? Alain (Kim) e Lyn, apresentam-se.
- A Jasmyn não está? Demora? – questiona Lyn.
- Não! Foi trabalhar e só volta no final da tarde!
- Hummm!!!
Eu, tronco nu, meio recostado na cama, olhava aquele rosto lindo adornado por um alvíssimo longo casaco peludo. Nada denunciava o escultural corpo que este cobria. Despiu-o e lentamente depositou-o num minúsculo canapé de bambu, decidida a não sair tão cedo.
Aquela visão logo me fizera não mais pensar em quem seria Lyn e como obtivera a chave do quarto.
- Sou uma amiga de Jasmyn – respondeu, como que adivinhando a minha dúvida.
O seu sorriso, dissipara-me receios infundados.
Apesar de Jasmyn nunca me ter falado de Lyn, já que esta tinha a chave do seu mundo, passaram-me pela cabeça várias hipóteses e por que não companheiras de quarto.
Lyn, tinha tanto de morena como de linda. Olhos já vividos e corpo desbravado.
O “meu” inglês não bastava para uma conversa formal, mas ia resolvendo e colmatando com aquilo que os sorrisos diziam.
Olhava-a, desejando tudo e esperando nada.
A exiguidade do espaço foi pretexto para sentar-se na beira da cama. Trocaram-se pequenas confidências e descobertas em olhares matreiros.
Aos poucos me enfeitiça e desliza no meu leito. Vai tomando conta de mim. Sinto-lhe as hormonas em ebulição. Quase me limito a olhar, lutando contra mim.
A linha que separava a provocação, do desejo, era ténue demais para não ser entendida.
A janela enfeitada por uma cortina vermelho-sol, saída da rota da seda, clareava o minúsculo quarto onde tudo acontecia.
Doze metros quadrados de intimidade, no máximo, eram o mundo de Jasmyn. O nome europeizado pela sonoridade, era vietnamita pelo berço e holandês por ambição.
Ali era cozinha, sala, quarto, casa de banho.
Não era a primeira vez, mas seria a última, que eu ali ficava refastelado no quentinho da policama, enquanto Jasmyn ia trabalhar.
A cozinha dum restaurante asiático, provavelmente também vietnamita quanto ela, era a fonte do seu sustento.
Despediu-se de mim com um beijo na testa e uma carícia no rosto. Partiu. Quarenta anos de mulher, duas vezes de mim, deixavam para trás um desejo saciado e fenecido, na esperança de outro no regresso.
Lá fora o frio convidava o guerreiro do amor a repousar da diaforese havida, mais bélica que apaixonada. Depois era só puxar as orelhas aos lençóis e estender a tolha de mesa sobre o colchão impregnado de odores perenes.
Deitado, ora adormecendo, ora preguiçando, olhava aquele liliputiano mundo que conhecia já de sobejo e pensava em como ocupar o resto do dia, quamanho era o meu tempo.
Na escada do prédio, o cadenciado barulho de passos fez-me convergir o olhar para a porta do quarto. Um tornear de chave e maçaneta fizeram-me gelar. Especada à porta do quarto, uma jovem asiática, aparentando os meus vinte anos, franze o sobrolho de espanto. A visão dum desconhecido naquela cama, não menos espantado que ela, fá-la hesitar.
Fecha a porta sem tirar de mim o olhar. Quem és tu, quem sou eu? Alain (Kim) e Lyn, apresentam-se.
- A Jasmyn não está? Demora? – questiona Lyn.
- Não! Foi trabalhar e só volta no final da tarde!
- Hummm!!!
Eu, tronco nu, meio recostado na cama, olhava aquele rosto lindo adornado por um alvíssimo longo casaco peludo. Nada denunciava o escultural corpo que este cobria. Despiu-o e lentamente depositou-o num minúsculo canapé de bambu, decidida a não sair tão cedo.
Aquela visão logo me fizera não mais pensar em quem seria Lyn e como obtivera a chave do quarto.
- Sou uma amiga de Jasmyn – respondeu, como que adivinhando a minha dúvida.
O seu sorriso, dissipara-me receios infundados.
Apesar de Jasmyn nunca me ter falado de Lyn, já que esta tinha a chave do seu mundo, passaram-me pela cabeça várias hipóteses e por que não companheiras de quarto.
Lyn, tinha tanto de morena como de linda. Olhos já vividos e corpo desbravado.
O “meu” inglês não bastava para uma conversa formal, mas ia resolvendo e colmatando com aquilo que os sorrisos diziam.
Olhava-a, desejando tudo e esperando nada.
A exiguidade do espaço foi pretexto para sentar-se na beira da cama. Trocaram-se pequenas confidências e descobertas em olhares matreiros.
Aos poucos me enfeitiça e desliza no meu leito. Vai tomando conta de mim. Sinto-lhe as hormonas em ebulição. Quase me limito a olhar, lutando contra mim.
A linha que separava a provocação, do desejo, era ténue demais para não ser entendida.
A sua linguagem corporal, agressiva e sedenta, continuava a povoar-me os sentidos.
Por instantes pensei em Jasmyn, com quem não tinha qualquer espécie de compromisso, nem na vida, nem no leito. Aliás, tive sempre a impressão que lhe amenizava a entrada na meia idade, fazendo-a recordar o muito que tinha ainda para dar. Apenas por instantes, pois logo num recíproco impulso felino, se devoraram as bocas e esmagaram os corpos. O meu, extremamente maleável, sucumbia àquele proficiente e insaciável apetite saído dum conto de Boccaccio.
Depois passaram as horas e esquecemos o tempo que o tempo tem.
Era já tarde quando adormecidos num abraço, despertámos com o abrir da porta.
Era Jasmyn. Chegara. Menos cansada que nós. Olhou-nos com um sorriso de ódio. Alguns longos emudecidos segundos separaram os olhares entre a porta e a cama.
Jasmyn, conformada, deixou escapar:
- Olá Lyn!
- Olá mãe!
Por instantes pensei em Jasmyn, com quem não tinha qualquer espécie de compromisso, nem na vida, nem no leito. Aliás, tive sempre a impressão que lhe amenizava a entrada na meia idade, fazendo-a recordar o muito que tinha ainda para dar. Apenas por instantes, pois logo num recíproco impulso felino, se devoraram as bocas e esmagaram os corpos. O meu, extremamente maleável, sucumbia àquele proficiente e insaciável apetite saído dum conto de Boccaccio.
Depois passaram as horas e esquecemos o tempo que o tempo tem.
Era já tarde quando adormecidos num abraço, despertámos com o abrir da porta.
Era Jasmyn. Chegara. Menos cansada que nós. Olhou-nos com um sorriso de ódio. Alguns longos emudecidos segundos separaram os olhares entre a porta e a cama.
Jasmyn, conformada, deixou escapar:
- Olá Lyn!
- Olá mãe!
O que mais se disse é passado. O que ficou por dizer não importa.
Afinal, recordar - é viver! In - As aventuras de Kim-Kim!
13 comentários:
Kimamigo
Essas éke são recordações. E a pairar sobre elas o velho ditado: tal mãe, tal filha. Nada. Pelo que contas a filha era melhor do que a mãe; ou seja, era pior.
Belo testículo (com x), ritmado, vibrante, mas simultaneamente saudoso e descompassado. Os extremos tocam-se e nos antípodas as pessoas andam com os pés no ar.
Também, vê lá tu, andei por Amesterdão, tinha eu os meus dezoito anitos. O meu Pai caíra na asneira de me emancipar por via da carta de condução.
Tinha uma amiga do Pen Pal, a Inga. Resumindo: dois meses de entusiasmo quotidiano (naquela idade era um verdadeiro sempre-em-pé) e de repente o anúncio de que no fim-de-semana iríamos a Delf para os pais dela me conhecerem.
Claro: dois dias depois, desembarcava em Santa Apolónia. Casar aos 18 anos? Uma merda! Mande-a fod.., fornicar com outro se lhe dizer nada. Pirei-me.
Ao pe de mim, o Ricardo Carvalho é um santo homem. Desertor? Quem desertou fui eu - em 1959, ainda não começara a guerra colonial.
Já está
gezondheid, geld en vrouwen. Leef het leven aan het bekijken en bedankt lieverd
C'um caneco, homem...isso é que foi!!! Aé transpirei! Ainda bem que o quarto era pequeno...e Inglês para quê? O que se não diz pelos lábios dizem-no as acções, os olhares, o suor das mãos...
Mas bolas...ela ser filha de Jasmyn...raios...não admira esse olhar "com um sorriso de ódio"!!! canecos...ainda estou a transpirar!!!
Muito bom , o texto (o resto não sei, só imagino...LOLOL)
Kim,
Imagino o teu constrangimento : a noite com a mãe e o dia com a filha...que provavelmente acabou como a mãe, lutando sozinha com uma filha, num apartamento pequeno procurando a juventude para "esquecer" que ninguém casa com mulheres descartáveis...
Beijinhos
Verdinha
Kim (Alain)
Que aventura, amigo!
Viveste bem a tua juventude, não foi?
Gostei da história. Sincera, tragicómica, algo erótica, sem chegar ao exagero.
Tu escreves bem, Alain! Como o Kim.
Beijinho
Maria
Digamos que fiquei assim um bocadinho surpresa, amigo Kim, talvez porque o conheça há muito pouco tempo...
Não que seja demasiado puritana, nada disso... mas sou mulher, e nessa condição, imagino como seria a cena depois da sua saída de cena :)
Muitíssimo bem narrado, o texto tem até um bom toque sensual que muito apreciei.
Beijinho
Ná
Seu texto é muito bom. Soube falar de um assunto difícil com delicadeza e emoção.Adorei o comentário da BlueShell! bjs
Com muito carinho desejo um
abençoado final de semana.
Alegria ,saúde e paz no coração.
Bjs,De paz e luz.
Evanir
Oh lá-lá-lá-lá!
Tudo no tempo certo.
Beijinho
Isabel
Se foi assim, penso que muito mais haverá para contar e deliciar o pessoal com coisas da vida, coisas vividas, e claro, a vida é e era tua, da minha parte; nada a censurar, há sempre quem critique, mas, se tivesses esperado que a dona da casa chegasse....apresentava-ta primeiro ehhhh, mas se ela era uma amiga dela, ora pois... a filha é que devia ter pensado mais.. mas com um bonitão como tu quem ia resistir?
Rapaz lindo, malandro cheio de vida e vontade de a viver..A vida é assim:
beijinhos da dolce.
Kim,
Escreveste as tuas aventuras nessa tenra idade? Pois bem, vai trazendo novos episódios. Com a carinha que vejo aqui publicada e jovem assim à solta por esse mundo fora, não me admiro nada que as aventuras sejam mais que muitas... :))
Beijos
Branca
Gostaria imenso de conhecer as cenas dos próximos episódios, amigo Kim. Sou muito curioso...
Entretanto, está convidado a passar pelo CR para comer uma fatia de bolo e beber uma taça de champagne.
Olá Kim!
Essas aventuras do Kim-Kim dariam um belo argumento para um filme sobre sexo, ciúme, lágrimas, ódio e constrangimento.
O único senão é que não poderia ser visto "em família".
Essa Lyn devia ser fresca...devia!
Coitada da Jasmyn...
Já agora e porque há quatro décadas atrás o Alain Delon estava na berra, seria ele o actor ideal para interpretar o personagem principal.
Parabéns Kim, pelo primor da escrita.
Beijinhos
Janita
Sim meu amigo, recordar é viver....
Eu adoro as tuas memorias.
SPUK
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